

Já no título, a exposição comemorativa aos 30 anos do Itaú Cultural dá ideia de sua grandiosidade: Modos de Ver o Brasil, propondo uma reflexão acerca das múltiplas influências presentes neste conjunto. O plural serve, justamente, para abarcar a diversidade contemplada na mostra, que faz um recorte do Acervo de Obras de Arte Itaú Unibanco, composto de 15 mil peças.
O local escolhido para sediá-la também é emblemático: as 750 obras, sendo 48 recém adquiridas, ocupam os 10 mil metros da Oca, um dos símbolos arquitetônicos de São Paulo, integrante do conjunto de instalações do Parque Ibirapuera, projetado por Oscar Niemeyer.
– Nosso desafio foi pensar a formação social do Brasil em dois eixos: ético e estético – explica o curador Paulo Herkenhoff, que conta com a co-curadoria de Thais Rivitti e Leno Veras.
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Esse é o maior recorte do acervo exibido em conjunto até hoje - a primeira obra, Povoado numa Planície Arborizada, do pintor holandês Frans Post, foi adquirida por Olavo Setubal, no final dos anos 1960. A equipe curatorial concebeu a mostra em camadas – seja pelo caráter da arquitetura do espaço, seja pelo desvendamento dos itens da coleção –, propondo leituras transversais e passando por reflexões sobre questões de gênero e racismo, por exemplo.
– Essa não é uma exposição para quem sabe tudo, mas para quem quer descobrir algo – afirma Herkenhoff, destacando que está contemplada nesta seleção a história de "vencedores e vencidos".
Os curadores decidiram apresentar uma constelação de 20 núcleos para serem percorridos pelos visitantes, mesclando a história do acervo à da construção do Brasil, fazendo articulações e rupturas entre elas. Os trabalhos ocupam os quatro andares da Oca, procurando estabelecer uma leitura ampliada do acervo. Não há sequência cronológica, mas todos os corredores apresentam nexos e diálogos entre as diferentes produções artísticas. É justamente essa pluralidade que possibilidade o – pretensioso – modos de ver o Brasil.
Obras emblemáticas como a escultura em bronze O Impossível, de Maria Martins, Iyä Agbá – Mãe Ancestral, de Mestre Didi, os sem título de Tomie Ohtake, trabalhos do pintor Candido Portinari, ou a evocação ao barroco no Azulejão, 2000-2001, de Adriana Varejão contemplam essa diversidade.
Para o presidente do Itaú Cultural, Eduardo Saron, o desafio da instituição é transformar o público em sujeito:
– Passar da satisfação pelo acesso à arte, que já foi conquistada, para a democracia cultural.
OS ANDARES
:: São Paulo recebe o público no piso Térreo. Fotos e obras sobre a cidade, desde a sua fundação a trabalhos produzidos em 2017, convidam a um entendimento sobre a capital do Estado.
O andar trata da modernidade, do concretismo, do neo-concretismo, da contemporaneidade – passado, presente e indicações para o futuro. Para isso, cruzam-se olhares de artistas como Militão, Joaquim Pedro, Mario de Andrade, Alfredo Volpi, Almeida Junior, Benedito Calixto. Claudia Andujar, etc.
:: O subsolo guarda experimentos da arte brasileira, com os núcleos Cibernética Conceitual, Teoria dos Valores, Natureza, Subjetividade, Escritura e Gambiarra. Cildo Meirelles está neste piso, com a litografia sobre papel moeda Zero Cruzeiro. Além destes, o andar reúne um grande número de artistas que vão do pop Antonio Dias ou Antonio Henrique Amaral, a Beatriz Milhazes ou Berna Reale, em subjetividades, passando por Portinari, e os contemporâneos Iran Espírito Santo, Paulo Bruscky, Hélio Oiticia, Lygia Clark.
:: O primeiro andar se situa no pós-guerra (Segunda Guerra Mundial), um momento, segundo os curadores, em que um conjunto de questões aglutinaram os artistas brasileiros em torno das artes visuais. Os núcleos são: Geracional, Bidimensional – Regimes da Cor, Bidimensional – Geometria da Luz, Tridimensional. Estão aqui a primeira geração de cinéticos, como Abraham Palatnik, as cores de Amélia Toledo ou as gravuras de Maria Bonomi. Ana Maria Maiolino, Antonio Manuel, José Resende, Paulo Pasta, Maria Martins, com trabalhos como O Impossível, e Spider, a aranha de Louise Bourgeois.
:: No segundo piso e último, o passeio segue pela formação social do Brasil: o Barroco e Neo Barroco, tendo, igualmente, foco em duas passagens traumáticas da história brasileira – a escravidão e a conquista das terras indígenas. Aqui tem Aleijadinho e Mestre Valentim, mas também a contemporânea Adriana Varejão; ou, ainda, Albert Eckhout e Alberto da Veiga Guignard. Pode se ver, neste andar, um documento de venda de escravos ao lado da quantidade de moedas de ouro que representava o seu valor como mercadoria. É aqui que se concentra o núcleo afro-brasileiro, com 17 das obras recém adquiridas de artistas como Alcides Pereira dos Santos, Ayrson Heráclito e Jaime Lauriano.
Artistas contemporâneos
Modos de Ver o Brasil: Itaú Cultural 30 Anos inclui, ainda, peças significativas de artistas contemporâneos, como Adriana Varejão, Beatriz Milhazes, Vik Muniz, Berna Reale, Jaime Lauriano, Ayrson Heráclito e Eder Oliveira. Destes últimos, algumas figuram entre as novas aquisições, como Bandeira Nacional # 10, Novus Brasilia Typus: invasão, etnocídio, democracia racial e apropriação cultural e Artefatos # (1, 2 e 3), de Lauriano, todas de 2016; quatro trabalhos da série Cabeças Bori, de Heráclito, ou duas sem título, de autoria de Eder Oliveira, ambas de 2015.