Para quem desconhece as raízes do tradicionalismo, talvez fique difícil entender a relação entre um homem e seu cavalo: um não existe sem o outro. Se parece exagero, é só acompanhar a letra de César Oliveira e Rogério Melo: "A morte de um pingo na lida da doma é a tristeza que assoma no olhar de um campeiro".
José Leonido Borges Monfron, conhecido como Treco, 70 anos, é a típica imagem do gaúcho: olhos atentos, voz grossa, bigode branco, sempre pilchado e com a cuia na mão.
Completa a estampa de peão campeiro a égua com que ele disputa as provas de rédea em rodeios. Raposa, como é chamada, completa 14 anos daqui a um mês. Ninguém, porém, a chama pelo nome. Entre os mais chegados, o animal ganhou o apelido carinhodo de Tubi, diminutivo de Tubiana, pelo característico de animal de duas cores.
Das 26 provas de rédea em que concorreu, Tubi tirou 14 primeiros lugares. Nada mal para uma égua que foi comprada por R$400, aos sete anos de idade. Apesar das qualidades, Tubi não tem jeito de campeã: é pequena, não está muito gorda, o pelo é arrepiado. Chega a sumir perto de outros cavalos crioulos.
- Quando eu chego com ela as pessoas olham e pensam "é um caquinho, não vai ganhar nada" - diverte-se Treco.
Mas Tubi tem talentos que a tornam muito especial: além das provas de rédea, ela é usada também por Gabriel Pereira, 13 anos, amigo de Treco, nas provas de laço.
Treco diz que já ofereceram R$12 mil pela égua. Ele, porém, adverte: não há preço que o faça vender a pequena Tubi.
- O amor que a gente tem por ela é muito grande. Minhas filhas e minhas netas montam nela. Se depender da gente, vai morrer na estrebaria - diz ele, que foi ainda quem terminou de domar o animal.
Por tudo isso, Tubi é tratada com todo o carinho. Enquanto encilha o animal, Treco diz palavras como "te gosto", chama-a de "Tubi velha" e faz carinho nos cascos, para verificar se não estão machucados. É ele mesmo quem trata da égua diariamente.
- Cuidar bem do animal é a forma do gaúcho dizer que gosta, é o nosso eu te amo - encerra, mesmo sem saber, como nos versos da música Os Monarcas, famosa por relatar a amizade entre peão e cavalo: "Chega de brutalidade, de rasgar cavalo ao meio, porque cavalo e gaúcho dessa pátria são esteio".